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quarta-feira, 12 de maio de 2010

Teatro de A à Z, por Paul-Louis Mignon

Fernando Arrabal, nascido em Mellila ( antigo Marrocos espanhol) 11 de agosto de 1932.
Ele tinha então 4 anos quando a guerra civil eclode no seu país. Ele não vai jamais rever seu pai, preso pelos franquistas, e sua mãe fará de tudo para apagar a presença e a lembrança desse marido cujas convicções não compartilha.
- Dos quatro aos oito anos, durante a guerra, disse ele, eu conheci intimamente o ódio, a ferocidade. O choque que senti jamais deixou de agir sobre mim; desde então nunca os acontecimentos conseguiram me impressionar da mesma forma.
Com a prisão de seu pai, sua mãe parte para Ciudad Rodrigo e, 3 anos depois, Madrid. É na escola, durantes as festas de fim de ano, que ele descobre o prazer do espetáculo.
- Eu tive então a idéia de construir um teatro em miniatura com personagens recortados de fotos de jornais as quais eu colava em pedaços de madeira. Minha irmã e eu os manipulávamos dividindo os papeis. Eu comecei a compor um repertório para divertir minha família.
Entre as numerosas peças que escreveu, a Guerra da Coréia inspirou “Piquenique no Front”. Ele escreverá ainda “O Triciclo”. Tinha apenas 17 anos.
- Em suma, eu comecei a fazer teatro antes mesmo de ter visto uma apresentação de uma peça, no sentido profissional do termo.
Depois dos estudos em Tolosa – preparatórios para a industria do papel – ele se volta para o direito, ocupando, em Madrid, um cargo de escritório. Ele vai muito ao teatro. Assiste Calderon, Benavente, alguns esquetes..
- Em seguida, devido a uma representação única para os estudantes, assisti “Esperando Godot”. Foi uma revelação, a revelação. De repente o teatro me pareceu vivo. E eu senti que minhas peças poderiam ser interpretadas. Isso me encorajou a me dedicar cada vez mais.
Quando, em 1954, descobre que o Berliner Ensemble e Brecht saem de Berlim e vão a Paris, ele sente necessidade de assistir o evento, indo lá de carona.
- Brecht era um mito fantástico. Eu não compreendi uma palavra sequer, mas diante da encenação de “Mãe Coragem” – eu me lembro particularmente do momento em que Helène Weigel depenava um frango – eu fui ao êxtase.

Um de seus amigos inscreve “O Triciclo” em um concurso. A peça ganha. A Embaixada da França oferece a Arrabal uma bolsa para estudar teatro em Paris. Em 1955 descobre que está com tuberculose.
- Um salário de empregado na Espanha me dava o mínimo para comer. Os dois anos passados no sanatório de Bouffémont, no entanto, não foram perdidos. Eu não fazia outra coisa além de ler e escrever.
“O Triciclo” é criado na Espanha em 1957 ( a peça é encenada uma única vez).
- Houve uma verdadeira batalha entre os “prós” e os “contras”. Os espectadores brigavam entre si.
Em Paris, sua mulher inscreve “O Triciclo” à Comissão de apoio à primeira peça. Jean Mercure toma conhecimento do manuscrito, o qualifica de raro e o recomenda a Jean-Marie Serreau. Este pede para ler outras peças.
- Com a intervenção de Genevieve Serreau, Rene Julliard decidiu as editar e me enviar uma mensalidade que, durante muito tempo, me permitiu viver.
Jean-Marie Serreau encena “Piquenique no Front” (Lutece, 1959)
[...]
Produziu muito? Ele explica:
- De fato, essa é toda minha atividade com os Cadernos de Teatro que dirijo. Cada dia, quando escrevo (escrevo, acrescenta, em francês ruim e corrijo com minha esposa) é o momento em que me divirto. Cada peça corresponde a um estado de espírito, as minhas preocupações, quando a escrevo. É por isso que meu teatro se organiza em torno de elementos que me são essenciais, Arrabal claro, a mãe, a realidade, os sonhos, o absurdo. “O jardim das delicias” está relacionado a descoberta de minha irmã durante minha prisão em Madrid, em 1967. Quando éramos crianças nos víamos pouco. Em seguida, nos perdemos de vista. “O jardim das delicias” é sua vida, é a minha tal como a percebia na época.
Eles colocaram algemas nas flores” nasceu do choque que tive quando soube que o homem tinha pisado na lua. Procurei saber o que meus companheiros de prisão pensavam.
“O Coroamento” data do período em que freqüentava a casa de André Breton. Parte de uma anedota pessoal, porém enriquecida pelo universo de Breton, pelo surrealismo.
Me falam muito de Sade. Eu sou um estranho à obra de Sade (a sua credibilidade), porem reconheço sua genialidade. É ao universo de Shakespeare que sou mais sensível. Eu vivo os eventos contemporâneos. Em maio de 68 eu fui para minha casa escrever uma peça sobre as barricadas, “A Aurora vermelha e preta”. Não pensando em política. Eu não sou um homem político. Eu não tenho lição a passar. Eu sou um homenzinho tão livre quanto é possível.
Os sonhos tem tanta influência quanto a realidade. Um pesadelo que tive na manhã que operei o pulmão se encontra exatamente no “Labirinto”. Geralmente, creio que é necessário utilizar todos os nossos fantasmas, não se limitar ao envelope exterior de nossa vida para ser verdadeiro. É isso que procuro, não provocar, nem chocar.



MIGNON, Paul-Louis. l'Avant - Scène, n. 443. 1970, Paris, França.
Tradução: Marcelle Pamponet

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